Enquanto a pauta em Brasília esta semana, segundo a Agência Senado, se concentrava na regulação de serviços de streaming e direitos autorais na era digital – uma discussão necessária, porém atrasada –, um movimento cultural silencioso e poderoso que acontece de Nova York a Tóquio expõe uma camada muito mais profunda sobre o comportamento do consumidor no século XXI: a ascensão da “Economia da Nostalgia”.
O debate no Congresso foca em como distribuímos e monetizamos o conteúdo digital em massa. É o jogo do volume, da escala, do algoritmo. Contudo, do outro lado do mundo, a tendência não é apenas sobre o que se consome, mas como se consome. Estamos falando de um hábito que parecia enterrado: a compra de discos de vinil. No Japão, grandes lojas de departamento reabriram andares inteiros dedicados a eles. Em Londres e no Brooklyn, micro-selos independentes florescem lançando LPs.
Isso não é apenas um capricho de hipsters. É um sinal econômico. Em um mundo de intangibilidade, onde músicas e filmes são apenas dados em uma nuvem, uma parcela crescente de consumidores busca o físico, o tátil, o ritualístico. Eles não estão comprando apenas a música; estão comprando a experiência: a capa grande, o cheiro do encarte, o ato de colocar a agulha no sulco do disco. É um movimento de contra-ataque à superfluidade do digital.
Aqui está a conexão que escapa à discussão puramente tecnológica em Brasília. A Agência Brasil noticia que o Ministério da Cultura lançou editais para a “preservação do patrimônio histórico-cultural”. Inconscientemente, o governo toca no nervo certo, mas pela ótica errada. Ele enxerga o passado como algo a ser preservado em um museu, enquanto a tendência global o transforma em um produto de consumo premium, um ativo econômico vibrante.
O que vem a seguir? A “Economia da Nostalgia” não se limita à música. Ela se estende a videogames com gráficos de 8-bits, à moda que recicla décadas passadas e até ao turismo que busca experiências “autênticas” e analógicas. Para o Brasil, um país com uma riqueza cultural e estética tão vasta e reconhecível globalmente, isso representa uma oportunidade gigantesca.
A questão prospectiva não é como vamos regular o Spotify, mas como vamos posicionar a Bossa Nova, o design de mobiliário dos anos 60 ou a estética do Cinema Novo nesse mercado global da saudade. Estamos preparados para empacotar e vender nossa nostalgia não como peça de museu, mas como uma experiência de consumo relevante e desejável para um público global que está fatigado do excesso de telas e da falta de significado?
Enquanto o Congresso debate os bits e bytes, uma economia baseada em átomos e emoções está se consolidando. Se não entendermos essa onda, correremos o risco de, mais uma vez, ver nossa própria cultura ser redescoberta e vendida para nós por quem, lá fora, entendeu o futuro do passado antes de nós.